MATEMÁTICA – SUCESSÕES
A Lenda do Xadrez Há muito tempo atrás viveu na Índia um rei chamado Iadava, senhor da província da Tiligana. Foi um dos soberanos mais ricos e generosos do seu tempo. Houve uma guerra contra o aventureiro Varangul, que se dizia príncipe de Caliã. Apesar da vitória, muitos jovens pagaram com a vida a segurança de um trono e, entre os mortos, estava o príncipe Adjamir, filho do rei Iadava. Terminada a guerra, o rei recolheu-se aos seus aposentos e só aparecia para atender aos ministros e sábios. De que poderiam servir os ricos palácios, os elefantes de guerra, os tesouros imensos, se já não estava vivo, a seu lado, aquele que fora sempre a razão da sua existência? Um dia, o rei foi informado de que um rapaz pobre e modesto solicitava uma audiência. Como estava, no momento, com boa disposição, ordenou que trouxessem o desconhecido à sua presença. - Quem és, de onde vens e o que desejas? - perguntou o rei. - O meu nome é Lahur Sessa. Criei um jogo para o distrair e abrir no seu coração as portas de novas alegrias. É esse o presente que desejo oferecer a Vossa Majestade. O que Sessa trazia ao rei consistia num tabuleiro quadrado, dividido em sessenta e quatro quadradinhos iguais; e sobre este colocavam-se duas colecções de peças que se distinguiam pelas cores branca e preta. Cada um dos jogadores dispõe de oito peças pequenas (peões) que representam a infantaria, que ameaça avançar sobre o inimigo para desbaratá-lo. Secundando a acção dos peões vêm as torres, representando peças maiores e mais poderosas. A cavalaria, indispensável no combate, aparece simbolizada por duas peças que podem saltar, como dois corcéis, sobre as outras. E, para intensificar o ataque, incluem os bispos do rei, para representar os guerreiros cheios de nobreza e prestígio. Outra peça, mais poderosa do que as demais, é a rainha e representa o espírito de nacionalismo do povo. Completa a colecção uma peça que isolada pouco vale, mas que se torna forte quando amparada pelas outras. É o rei. O rei, interessado pelas regras do jogo, não se cansava de interrogar o inventor. Ao fim de pouco tempo, o monarca já conseguia derrotar os seus dignos vizires. Em dado momento, o rei fez notar, com grande surpresa, que a posição das peças, pelas combinações resultantes dos diversos lances, parecia reproduzir exactamente a batalha. - Reparai que, - ponderou Sessa - para conseguirdes a vitória, indispensável se torna, da vossa parte, o sacrifício desse bispo! Assim, ele demonstrava que o sacrifício de um príncipe é, por vezes, imposto como uma fatalidade, para que dele resultem a paz e a liberdade de um povo. Ao ouvir tais palavras, o rei falou: - Não creio que o engenho humano possa produzir maravilha comparável a este jogo interessante e instrutivo! Movendo essas peças tão simples, aprendi que um rei nada vale sem o auxílio e a dedicação constante dos seus súbditos. E que, às vezes, o sacrifício de um peão vale mais, para a vitória, do que a perda de uma poderosa peça. E, dirigindo-se ao jovem, disse-lhe: - Quero recompensar-te, meu amigo, por este maravilhoso presente. Diz-me o que desejas para que eu possa demonstrar o quanto sou grato àqueles que se mostram dignos de recompensa. Estas palavras deixaram Sessa imperturbável. A sua fisionomia serena não mostrava a menor agitação, a mais insignificante mostra de alegria ou surpresa. Os vizires olhavam-no estupefactos, e entreolhavam-se pasmados diante da apatia de uma cobiça a que se dava o direito da mais livre expansão. - Rei poderoso! Não desejo outra recompensa além da satisfação de ter proporcionado ao senhor de Tiligana um atempo agradável, que lhe vem aligeirar as horas dantes alongadas por acabrunhante melancolia. Sorriu desdenhosamente o bom soberano ao ouvir aquela resposta, que reflectia um desinteresse tão raro entre os ambiciosos hindus. E, não crendo na sinceridade das palavras de Sessa, insistiu:
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- Causa-me assombro tanto desdém e desamor aos bens materiais, ó jovem! Para que o homem possa vencer os múltiplos obstáculos que se lhe deparam na vida, precisa de ter o espírito preso às raízes de uma ambição que o impulsione a um ideal qualquer. Exijo, portanto, que escolhas, sem mais demora, uma recompensa digna de tua valiosa oferta. Queres uma bolsa cheia de ouro? Uma arca cheia de jóias? Um palácio? Uma província? Aguardo a tua resposta. - Recusar a vossa oferta depois de ouvir as vossas palavras seria menos descortesia do que desobediência ao rei. Vou aceitar uma recompensa que corresponde à vossa generosidade. Não desejo, contudo, nem ouro, nem terras ou palácios. Peço o meu pagamento em grãos de trigo. - Grãos de trigo??? - Estranhou o rei - Como te poderei pagar com tão insignificante moeda? - Nada mais simples. Dar-me-eis um grão de trigo pela primeira casa do tabuleiro; dois pela segunda, quatro pela terceira, oito pela quarta e assim sucessivamente, até à sexagésima quarta e última casa do tabuleiro. Peço-vos, ó rei, de acordo com a vossa magnânima oferta, que autorizeis o pagamento em grãos de trigo, e assim como indiquei. O rei, os vizires e os brâmanes presentes riram-se, estrepitosamente, ao ouvir a estranha solicitação do jovem. Este, que poderia obter do rei um palácio ou uma província, contentava-se com grãos de trigo! - Insensato! - Exclamou o rei. - Onde foste aprender tão grande desamor à fortuna? A recompensa que me pedes é ridícula. Bem sabes que há, num punhado de trigo, um número incontável de grãos. Devemos compreender, portanto, que com duas ou três medidas de trigo eu te pagarei folgadamente, consoante o teu pedido, pelas 64 casas do tabuleiro. É certo que pretendes uma recompensa que mal chegará para distrair a fome durante alguns dias. Enfim, visto que a minha palavra foi dada, vou dar ordens para que o pagamento se faça imediatamente, conforme o teu desejo. Mandou chamar os matemáticos mais hábeis da corte e ordenou-lhes que calculassem a porção de trigo que Sessa pretendia. Os sábios, ao cabo de algumas horas de aturados estudos, voltaram ao salão para submeter ao rei o resultado completo dos seus cálculos. - Rei magnânimo! - Declarou o mais sábio dos matemáticos. Calculámos o número de grãos de trigo que constituirá o pagamento pedido por Sessa, e obtivemos um número cuja grandeza é inconcebível para a imaginação humana: 18 446 744 073 709 551 615. - Avaliámos a porção de trigo que deve ser dada a Lahur Sessa. Equivale a uma montanha que seria cem vezes mais alta que o Himalaia! A Índia inteira, semeados todos os seus campos, não produziria em 2000 séculos a quantidade de trigo que, pela vossa promessa, cabe, em pleno direito, ao jovem Sessa! De facto. feito o cálculo aproximado para o volume astronómico dessa massa de trigo, afirmam os calculistas que a Terra inteira, sendo semeada de norte a sul com uma colheita por ano, só poderia produzir a quantidade de trigo que exprimia a dívida do rei no fim de 450 séculos! Essa quantidade poderia encher um cubo que tivesse 9400 metros de aresta. Se fôssemos, por simples atempo, contar os grãos de trigo à razão de 5 por segundo, trabalhando noite e dia sem parar, gastaríamos 1170 milhões de séculos! Adaptado de: CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS – Lenda do Xadrez [Em linha]. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro [Consult. 21 Nov. 2008]. Disponível em URL:
1. Escreve por extenso o número a negrito. 2. Calcula, recorrendo à folha de cálculo, o número de grãos em cada uma das casas do tabuleiro. 3. Investiga qual é a quantidade de trigo produzida anualmente no planeta nos dias de hoje, e quanto tempo seria necessário para conseguir a quantidade de trigo pedida por Sessa ao rei.
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